Coronavírus, e agora?

Coronavírus, e agora?

Escrito por Ana Cristina Costa França, em 18 de março de 2020.
A autora é Psicóloga Clínica, Mestre em Psicologia: Teoria e Pesquisa do Comportamento, Professora universitária e Sócia proprietária da Salutem Psi.

Eu estava há dias pensando em escrever sobre a “pandemia do Covid-19” que tem assolado o planeta, mas ainda com receio de como abordar o tema tão delicado.
Hoje pela manhã, recebi uma mensagem que me fez refletir e decidir escrever sobre. Era mais ou menos assim: “Tudo o que fizermos antes de uma pandemia, parecerá alarmista. Tudo o que fizermos depois dela, parecerá insuficiente.”
Acho que o ponto de equilíbrio tão difícil e almejado está exatamente em descobrir o meio termo: não ser alarmista-desesperado-paranóico-surtado, nem fanfarrão-lógico-imparável-inatingível. Talvez seja esse o ponto mais difícil: encontrar a sensatez e o equilíbrio de pensamentos e ações.
Parece que em tempos de crise, há uma tendência generalizada aos extremismos: ou se nega tudo por completo, e menospreza os sintomas, tentando se mostrar o sensato-corajoso que não cede a uma “gripinha” ou se entrega completamente ao desespero e sai surtando comprando álcool em gel, máscaras e papel higiênico (?!?) e estocando em casa, para uma possível hetacombe.
Vamos analisar os dois extremos e ver como ambos são prejudiciais.
Primeiro os que surtam, se tornam monotemáticos e só conseguem pensar, falar, agir em torno do Coronavírus. Passam horas a fio compartilhando mensagens nas redes sociais, não verificam a veracidade das informações e tomam tudo como verdade. Esses criam e propagam o pânico em torno de si e alimentam a paranoia. Esses fazem filas no supermercado e farmácias e acabam com estoque de produtos em uma demonstração de egoísmo e egocentrismo patológicos.
Há, no extremo oposto, os que minimizam a situação, dizem que é apenas uma gripe, por não se acharem em “grupos de risco”, negam sua participação e responsabilidade. Acham que é tudo um exagero, que as pessoas estão enlouquecendo (não estou negando esse fato, parece que muitos estão realmente). Esquecem que “nenhum homem é uma ilha” e só conseguem avaliar (se é que conseguem) a própria situação ou os que estão mais próximos. Esquecem que somos uma sociedade e não um amontoado de pessoas.
Nos dois casos, noto um ponto em comum: essas pessoas não estão preocupadas com a coletividade ou com o bem comum: seja pelo excesso de cuidado e pânico ou seja pela negação do problema e consequente omissão, nenhum deles faz nada de útil para a sociedade.
São ambos personagens que demonstram uma patologia talvez mais grave: a da centralização dos problemas em si próprio. O outro é apenas fundo para sua existência, não conseguem pensar que somos uma espécie social, que vivemos em um planeta que está agonizando por causa das nossas (i)rresponsabilidades.
Talvez seja o momento de parar para pensar em o que precisamos fazer para nos precaver de situações como a da atual pandemia: estamos doentes porque estamos cada dia trabalhando mais, cada dia parando menos, cada dia ouvindo menos o outro.
O Conselho Federal de Psicologia publicou um Comunicado à categoria de Psicólogos, no último sábado, dia 14/03/20, orientando psicólogas e psicólogos sobre o papel da Psicologia e as estratégias de atuação profissional:
“As ações da(o) psicóloga(o) devem contribuir para:
– orientar sobre aspectos de higiene que visem a minimizar riscos de contaminação;
– conscientizar sobre eventuais mudanças de hábitos e possíveis implicações emocionais advindas dessas mudanças;
– abordar, quando necessário, implicações emocionais de uma possível quarentena e de aspectos psicológicos do isolamento, em especial de pessoas idosas;
– exercer a profissão segundo os princípios do Código de Ética Profissional do Psicólogo, prestando informações precisas de modo a não causar pânico.” (fonte: https://site.cfp.org.br/coronavirus-comunicado-a-categoria/. Acesso em 17 mar 2020)
Estamos precisando parar e diminuir o contato social, precisamos nos isolar ou distanciar socialmente, e isso causa outros tipos de transtornos psicológicos. Cabe a nós, psicólogos, como profissionais da saúde (e não da doença), ajudar a controlar os extremismos, sem alarmismos desnecessários, mas também sem minimizar a situação (que é grave e séria, quando levamos em consideração o número de pessoas infectadas que podem precisar de maiores cuidados e até mesmo evoluir a óbito).
Como costumamos dizer em terapia: “nem tudo é sobre você”. O problema vai muito além de cada um de nós, e todos precisamos nos preocupar com o bem comum e ajudar com generosidade e nos dando as mãos (apenas no sentido figurado).
A supremacia do interesse público sobre o interesse privado deveria ser a principal preocupação agora, mas fiquemos cientes que, quando tudo isso passar, e vai passar, as sequelas ficarão: e nunca mais seremos os mesmos, teremos mais casos de ansiedade, de depressão, de TOC (já pensaram como esse negócio de lavar as mãos o tempo todo reforça o comportamento de um obsessivo-compulsivo por limpeza?). Que estejamos preparados para os novos paradigmas.

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